terça-feira, 10 de janeiro de 2017

A linguagem do Inconsciente

Uma das mais festejadas frases de Jacques Lacan é: “O inconsciente se estrutura como uma linguagem”. No texto anterior, valorizamos o aspecto matemático e refletimos sobre a ilusão que carrega a quantificação. Quando um executivo apresenta o orçamento para o próximo ano de uma determinada empresa com crescimento de 30% no faturamento ao longo dos meses poderá fazer brilhar os olhos dos acionistas e funcionários elegíveis a bônus. Eles se deixarão iludir mesmo estando cientes das projeções de PIB negativo para o ano em questão. Não é porque são números que é verdade. Números são como palavras – igualmente ilusórias e passíveis de diferentes interpretações. Não entendo um psicólogo que seja avesso a números. Conhecer estatísticas sobre o comportamento, dados como os que estão disponíveis na última pesquisa do IBGE, ajudam a apurar nossa escuta e iluminar nossas teorias e, sobretudo, nossa prática. De igual forma, não entendo psicanalistas lacanianos ou de qualquer outra escola que não se interessem pela linguagem e suas manifestações. Sejam no campo das letras e artes, seja pelo estudo comparado dos idiomas. É impossível ignorar a influência da língua alemã na obra de Freud ou do francês nos escritos de Lacan. Ou dos impactos de cada tradução. No caso do Seminário 11, feita pelo mestre MD Magno – que teve o privilégio de ser analisando de Lacan. Na primeira aula sobre este livro discorremos brevemente sobre a biografia do autor e o contexto da obra. Falamos também sobre as escorregadelas que permitiram ao fundador da Psicanálise se dar conta de que havia um inconsciente passível de ser observado através delas. Os sonhos, os chistes (piadas) e os ato-falhos seguem nos surpreendendo com um conteúdo desconhecido, que não sabíamos que estavam ali. Em cada língua, as palavras têm origens, sonoridade, ideias subjacentes diferenciadas. Tomemos, por exemplo, a questão da memória ou melhor, das falhas desta. É impossível lembrar de tudo. Há uma frase interessante de Freud: “esquecemos tudo aquilo que não podemos lembrar” pode, a princípio, parecer um pleonasmo. Mas se reparamos no verbo “Esquecer” temos em francês “j’oublie”. Em português “Eu esqueci”. Vejam em inglês “I forgot”. Acerca de objetos perdidos, muitas vezes o falante não utiliza o verbo forgot e sim a expressão “I misplace” isto é, não perdi apenas me esqueci do lugar que coloquei. Poderíamos continuar com este estudo comparado de forma profícua. A própria denominação “aluno” deixei de usá-la após descobrir que trata-se no sentido etimológico da palavra “sem luz” – talvez uma herança da influência religiosa nas primeiras escolas organizadas. Passei a adotar apenas estudantes, similar ao “students” Em françes, tem a beleza de remeter ao verbo elevar – l’élèves. Durante todo este na, vamos falar e escrever sobre os quatro conceitos fundamentais da Psicanálise, pinçados por Lacan: Inconsciente, Pulsão, Repetição e Transferência. Entre tantos outros foram destacados nesta obra tão difícil quanto apaixonante.