quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Megalomania

Com certeza você já ouviu esta palavra antes. No texto desta semana, vamos refletir sobre o que significa, o que há de positivo e o não muito razoável neste sintoma. Chamo de sintoma e já me corrijo mentalmente: os sintomas lembra m algo como: Sinto Mal. Dói. Mas este é, por assim dizer, um sintoma ao inverso: aparece quando o paciente sente-se bem demais. A ponto de Não ver nele mal nenhum. A cultura também não ajuda. Na verdade, seja a tradição Judaico-cristã, principalmente a reformada. Seja a América do Norte ou do Sul. Disney com suas historias fascinantes enche adultos e crianças de sonhos. A megalomania é acreditar tanto nos sonhos que deixamos de colocar os pés no lugar deles: no chão. Quando o dono do Unibanco e filho do Walther Moreira Salles - Pedro Moreira Salles, na ocasião presidente do Conselho, construiu os dez mandamentos que norteariam a nova cultura corporativa. "Cabeça nas nuvens e pés no chão". Era necessário mudar a impressão que o banco dava aos clientes de caro e elitista. Entraram em cena criaturinhas fofas nos anúncios e agências: os Unimons. Mas esse tipo de sonho grande, de cabeça de banqueiro, também ocorre com pessoas de todos os níveis socioeconômicos. Qual é o tamanho dos seus sonhos? todos nós, humanos, nutrimos em nossa mente ideias. Pensamos no parceiro ideal ou em fama, riquezas ou poder. A megalo(grandeza) mania fala disso. Ensaios no espelho para discurso de presidente da república com apenas 16 anos. Meu pai é uma "flor de obsessão" como o era meu amado Nelson Rodrigues. Ele repete umas 500 vezes as suas frases e ideias prediletas. Há quem diga que uma frase dita uma única vez, morre inédita. Pois bem - eis o que queria dizer: "Pense grande, comece pequeno e evolua rápido". Adoro esta frase paternal. Pensar pequeno pode ser ilustrado como aquele pescador que guardava os peixes menores e desprezava os grandes porque sua frigideira era pequena no seu fogareiro de duas bocas. Começar grande é como construir castelos no ar. Sem os pés no chão, com a cabeça sempre nas nuvens o que acontece são inúmeros tropeços. Caímos de joelhos. "If you fall in love, you can hurt your kennes". Isso quando não destrói o coração. A conta bancária. O nome e a credibilidade. A natureza não dá saltos. Só acredito em sucesso construído com muito suor, inteligência e trabalho duro. Sonhe. Realize. Acredite. Mas dê um passo de cada vez.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Caso ad.02.02 - Bruna sonha de novo

Entra meio correndo no consultório e nem sequer pergunto como ela está hoje. Tenho um sonho para te contar. Como você sabe tenho acordado no meio da noite. assim do nada. sem explicação. Acho isso meio sinistro. Outro dia meu irmão acordou para trabalhar e eu estava na sala "vendo TV". Ele me deu bom dia mal humorado e perguntou o que eu estava vendo. Eu respondi: Nada. Estranho, né? Outro dia vi um filme sobre exorcismo fiquei com aquilo na cabeça. O padre dizia que três horas da manhã é a hora do diabo. Isso porque as três da tarde Cristo morreu. Era tipo a hora dos milagres. E 12 horas depois, teríamos o contrário dos milagres. Sei lá. Acho que nem acredito nestas coisas. Acho que foram criadas para assustar as pessoas. Mas não gosto de acordar as 3 da manhã. Ontem minhas amigas me chamaram para ir no ensaio de uma escola de samba. eu pensei em ir. Acho que apesar de não conseguir sambar poderia ter sido legal. Engraçado isso: quando me convidam para alguma coisa e eu falto seja por preguiça ou medo de ser chato. No dia seguinte acordo com uma sensação terrível de que deveria ter ido. Que estou me tornando assim como "o homem da bolha". Mas ao mesmo tempo, dá um alívio de ter ficado em casa. Meio sinistro isso. É como se minhas escolhas não tivessem uma resposta certa. São ideias opostas, dra!!! Mas vamos ao meu sonho. Achei meio infantil, meio apavorante. Meio louco. Veja o que você acha: estávamos na praia. naquela mesma que costumo ir de dia. mas estava calor e fomos de noite. todos com a maior naturalidade, conversando. Sentamos em como se fosse uma roda na areia mesmo. Quando olho para o calçadão, tinha um urso!!! Sério. Um urso marrom. Parecia aqueles ursos polares, mas era marrom. ele era super sociável e popular. Veja que ninguém estranhava a presença dele. O fato haver um urso ali. em plena praia. conversando e rindo. Depois, eu e minha irmã mais velha saímos da praia e fomos andando. acho que para o ponto de ônibus. mas o urso continuava na minha cabeça. pasma que ninguém se desse conta do risco que ele representava. Percebemos que ele nos seguia...essa foi a parte agoniante. entramos correndo em uma casa de dois andares. minhas pernas doíam mas eu continuava a correr o mais rápido que eu podia. Sentia meu coração disparado, saindo pela boca. E tentava proteger minha irmã que parecia mais lesada do que eu neste caso. Quando chegamos ao segundo andar, era como um laboratório - tudo branquinho com vidros mas nem deu para reparar muito no lugar. o urso entrou logo atrás. peguei uma seringa e tentei espetar o urso mas ele já estava correndo na direção da minha irmã. Quando desci as escadas havia vários carros de polícia cercando o prédio. Luzes vermelhas no meu olho que começou a querer lacrimejar. Não dava tempo de chorar. Lembrei da minha irmã lá encima, sozinha com o urso e paniquei. Deu um calafrio no corpo todo e acordei suando. As três da manhã. Em ponto.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Pequena parte da minha cabeça

Arrumando meu guarda-roupa (o que se trata de literalmente uma missão impossível) achei umas folhinhas de caderno com este título e um balãozinho abaixo: "Você não queria me entender?" Ainda quero, minha Beatriz...não sei que idade tinha, não colocou a data desobedecendo Voltaire. Mas assinou todas as frases...mesmo as que pegou emprestado. Lá vai: "Me rebaixar, não te fará crescer!" "Se a culpa é minha, eu coloco ela em quem eu quiser". "Se você não gostar de você mesma, acredite, ninguém gostará!" "Enquanto a cor da pele for mais importante que o brilho nos olhos haverá guerra". "Faça! Se de errado foi uma experiência, se der certo, foi uma vitória!" "Não se preocupe com as pessoas más e cruéis, o que é ruim se destrói sozinho!" "A verdade dói quando é dita, a mentira a cada vez que é lembrada." "É possível ser feliz sem o dinheiro, mas é mais fácil com ele." "Cair é inevitável, continuar no chão é opcional." "Errar uma vez é humano, se errar de novo, pelo mesmo motivo, é uma escolha." "Se os seus esforços não forem reconhecidos, não fique triste, pois o sol dá um dos seus maiores espetáculos, ao nascer, a platéia quase toda está dormindo." "Você sempre vai achar alguém melhor que você, então, pare de se comparar". E, finaliza com a 13a frase: "Às vezes, a única coisa que falta é o verdadeiro amor." Beatriz Duarte

As palavras e as coisas

Meu assunto esta semana é o arrependimento. Sempre achei uma palavra linda mesmo antes de saber o que significava. Não sei você, querido leitor, mas eu tenho algumas palavras tão queridas que são como parentes comparáveis ao tio Evandro que eu quase nunca vejo ou ouço, mas quando aparece na cabeça ou pessoalmente me fazem sorrir. Em toda língua que procurei aprender tenho minhas predileções. São preferências sonoras e nada ou pouco tem a ver com qual significado daquele significante. O título mesmo deste post peguei carinhosamente emprestado de Michel Foucault - belo nome. Quelquefois é uma das francesas. Dá vontade de comer quelquefois de tão gostosa de falar. No meu caso vontade de comer é sempre e esta fofura significa "às vezes". Estou particularmente intrigada com estas palavras há umas três semanas. São elas: Arrependimento, culpa, perdão e indulgência. Vamos por partes. Não me conformo quando alguém fala esta frase acompanhada da gasta piada: "como Jack". Vejam vocês que este assassino esquartejador roubou-nos a pureza de uma expressão tão útil como esta. Imperdoável. Rien, rien de rien... Je ne regrette de rien. Canta Edith Piaf com aquela voz metalizada e exótica que "Não se arrependia de nada". Com a história de vida dela, bem contada no filme tenho certeza que o livro da sua vida deveria ter umas páginas coladas. Prefiro a honestidade cantada por Sinatra e Elvis e, por último (e mais importante para mim) pela cantora lírica Gélcia Improta - minha amiga. Regrets, I've had a few but then again, too few to mention". Ou seja, mais ou menos do meu jeito. tenho muito mais a agradecer que a pedir. Assim que inaugurei este blog em 2009 publiquei como primeiro texto "Influências e Agradecimentos". Isso mesmo começo pelo final. Como se as cortinas do espetáculo da vida pudessem se fechar a qualquer momento. E esta transitoriedade de tudo por aqui, inclusive e principalmente de nós mesmos. Vamos passar. Mas já escrevi bastante e não fui direto ao assunto, conforme meu costume. Hoje, ao pôr do sol, começa o Yom Kipur - o dia do perdão. Uma tradição judaica especialmente querida para mim. Não sou judia, nem budista, nem católica. Mas pego carona no que há de mais interessante para mim nestas e junto com minha origem presbiteriana, fazendo minha própria religião. Desculpe se esta afirmação escandalizar algum leitor mas o Deus é meu, individual e intransferível como meu cartão de banco. E as religiões estão todas aí para isso mesmo: religar as pessoas com Deus, sua espiritualidade e alma. Se de um lado os homens transformam o nome de Jeus ou Deus ou a trindade inteira por tiranos de culpa e massacre de almas. Por outro lado, aprendemos que o remédio para os males da culpa e do arrependimento tem como antídoto o perdão e a indulgência. O perdão dá ao ofendido uma certa posição de poder de Juiz. Pode te perdoar ou não. Mas, pelo simples ato de pedi-lo, já fez sua parte. Já a tão mal-falada indulgência que eram vendidas na época da reforma protestante do século XVI, como estudamos na escola, na igreja ou no Google. Palavra linda: indulgência. Parece com a sonoridade de inteligência, combina com excelência. E, em português de rua, é deixar barato. Entender que o outro não fez por mal. Tirar a culpa - desculpar. Libertar-se e, principalmente crescer em autoconhecimento e conhecimento da alma do outro. Desconfio seriamente que estamos neste mundo para isso.

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Eu te amo se...

Todo pai e mãe apresenta ao filho um caminho. Em primeiro lugar, o caminho do certo e errado. O conceito de Narcisismo na Psicanálise mais uma vez se aproveita de uma lenda. Narciso era um semideus belíssimo, cortejado pelas belas ninfas. Fascinante em sua graça e beleza. Um dia, passeando pela mata se curva à beira de um rio e contempla sua própria imagem. Fica tão deslumbrado com o que vê em seu reflexo que termina, de forma trágica, se lançando no rio em busca de um encontro impossível de amor por si mesmo. Temos, na teoria, dois tipos de narcisismo. O primário é o amor incondicional que o pequeno bebê recebe. Os pais amam os filhos sem condições nesta fase. Podem babar, chorar, vomitar. Tudo é lindo. Acordam de madrugada, não negam o amor e as boas coisas, diria as melhores. Sequer dormem quando o percebem doente. Pouco tempo dura o narcisismo primário. Em torno dos 18 a 24 meses as exigências começam. É claro que o amor não esmaece mas começa a ser cravejado de condições. Os pais começam a falar os famosos "Nãos". Seja para a proteção do bebê que já anda pela casa mexendo em objetos, caindo quando tenta correr. Mas o caminho do crescimento é impositivo. O bebê precisa desprezar o colo para crescer. Experimentar novos alimentos. Vibrar ao conhecer a música, dançar e chorar diante das broncas. É ser humano. Vai ser bípede. Vai se civilizar. Vai aprender a falar e ouvir. E, principalmente, será amado por fazer o que os outros querem. Vai ganhar "Parabéns" por ter ido ao peniquinho e olhares de reprovação quando diante da poça se dar conta que errou de novo. É o início do narcisismo secundário que o acompanhará pelo resto da vida. Somos amados pelo que fazemos, falamos e conquistamos assim o respeito dos outros. O caminho é longo mas não inglório. assim avançamos. Estudamos. Melhoramos. Só assim nos desenvolvemos como povo humano. A neurose se locupleta e se perde em exagerar na dependência deste amor. Lutam alguns pelo amor dos outros ou pelo respeito. E, assim, percorremos ressabiados, nosso longo caminho.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Selfish or Sell Fish?

Em um momento de grande inspiração com o amigo Marcelo Nova assim disse Raul: "O meu egoísmo é tão egoísta que o auge do meu egoísmo é querer ajudar". Na maioria das vezes, consideramos as pessoas egoístas por pensarem demasiado em si mesmo ou nos próprios interesses. Ledo engano. Todo o "ego", "eu" ou "self" conforme o autor consultado é uma espécie de ilusão. Uma das frases mais conhecidas do Gran Mestre Freud é: "O ego não é dono de sua própria casa". A psicanálise o reposicionou como o fez Copérnico retirando a Terra do centro do Universo. Ou Darwin colocando o ser humano na escala evolutiva. Sendo assim, o rei Ego foi devidamente destronado. Ele não comanda. O que nos dirige é o que não sabemos sobre nós mesmos. O antidoto desta equação é o autoconhecimento. Quanto mais me conheço, mais me torno compreensiva com o "modus operandi" alheio. Maior consciência de atos e palavras. e o mais fascinante: este caminho tende ao infinito. Podemos conhecer e prosseguir em conhecer ad eternum, para sempre...4EVER! Cada caminho de conhecimento se depara com um imponderável sem fim de possibilidades e descobertas. O título deste post é uma brincadeira com duas possibilidae: o que o leitor prefere? Selfish é a palavra inglesa para o Egoísmo. curiosamente, sem nenhuma relação etmológica, se separamos teremos Sell (Verbo-Vender) e Fish (Substantivo-Peixe). Existe uma curiosa expressão brasileira que diz: "Venda seu peixe". Alguns consultores famosos apregoam que, a primeira competência a ser desenvolvida é a de vendas ou comercial. Temos que ao longo de nossa carreira, seja ela de qual natureza for, vender. Vendemos nosso perfil para o mercado, nossas ideias, conhecimentos, tempo, energia ou serviços. Particularmente, vibro quando meus jovens pacientes surpresos com a própria falta de preparo, afirmam: "Vou vender, trabalhar em uma loja, sei lá". Sei lá é melhor do que não sei. Meu primeiro trabalho, ainda estudante foi vender. Vendi brigadeiro, bijuterias, folheados etc. Abri minha primeira empresa em 1980. Chamava-se SALIPA - Samuel e Liliane papelaria. Meu irmão como sócio. Meu pai e minha mãe como únicos e fiéis clientes. Carteira assinada mesmo foi só em 96. Em pé. 6,8,12 horas. Dobrando roupa no estoque. Shopping vazio ou cheio. Jovens, senhoras e crianças acompanhando às mães e avós. Caroço é quando o cliente olha e não compra nada. Se tocar em alguma roupinha, você perde a vez. Se for muito simpática pode ser que lembrem de você. Não é fácil vender peixe que dirá roupa. e a chefe. Minha primeira chefe se chamava Neize. Linda, chique, sempre com as caras roupas novas da coleção. Maquiada e linda me dizia: "Lili, Lili...acho que você até tem futuro mas tem muito o que aprender..." Sábias palavras. Boa chefe.

Caso ad.03.02

Estou de novo na sala de espera. A mesma. Passou-se quinze dias desde a última vez. É pouco tempo. Geralmente. Para mim foram duas semanas péssimas. Em 20 minutos tudo pode mudar -diz a propaganda da rádio no cinema. Acho que Band News. Vi no cinema outro dia. Nunca foi tão verdadeiro. A impressão que eu tenho é que mudo de dez em dez minutos. Sou considerada tímida, quieta. Isso para quem não me conhece. Minha mente não cala a boca. Estou sem medicação. "Ainda" - disse o médico. Ele tinha olhos claros. Adoro olhos claros, os meus são castanhos. Outro dia ouvi que Deus só dá olhos claros a quem precisa. Não concordo. Como ia pensando os remédios não aconteceram. Adorei o psiquiatra. A consulta foi rápida.Ele também não passou os exames que eu havia sonhado. Mas...me recomendou conversar com uma psicóloga. Olhei minha mãe com uma cara de "Eu não te disse?" mas depois mudei a cara rápido. Ela parece cada vez mais tensa. Credo. Quando era menor, pensei em ser psicóloga. Mas quero ganhar dinheiro. Muito dinheiro. E penso que nessa profissão deve ser um pouco difícil ou, pelo menos, demorado. Saiu uma psicóloga da outra sala mas chamou um homem aqui do meu lado. Bonita. Tomara que a minha seja simpática também. O nome dela é Liliane. Disseram que não é nova. Nem velha. E que é especialista em carreira. Olho para minha mãe com o canto do olho. Ela está no celular. Adora ver o celular. Põe a culpa no trabalho mas acho que é porque ela gosta mesmo. Penso se ela vai querer entrar comigo logo nesta primeira consulta. Tomara que não. Ela quer falar por mim como se eu tivesse seis anos. Irritante. Toda vez que vamos ao médico, ela quer dar todos as informações irrelevantes sobre mim. Conta do parto, da gravidez, da ausência do meu pai. E, eu, verde de vergonha me pergunto: "Por que um dermatologista precisa saber disso? Ele só tem que exterminar cravos e espinhas!" Liliane saiu da sala e chamou nós duas, como eu temia. Aliás, como eu suspeitava. (Continua...)

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Porque não escrevo sobre o meu pai.

Nasci em 1975. Era uma família simples. Uma professora de crianças e um pastor. Estava dentro da barriga da minha mãe em 1974 na quieta e calorenta cidade de Cachoeiro do Itapemirim. Nossa casa era bem humilde. Exatamente em fevereiro conheceria este planeta, depois de algumas aventuras intrauterinas que contarei aos leitores em outra oportunidade. O resultado foi que o feto capixaba virou um bebê carioca. Eu não dei minha opinião. Por motivos óbvios. Certa vez afirmei que o papel dos pais terrenos se confunde com o do Pai Celestial. Falava sério. E não mudei de opinião ainda. Chegamos ao Rio com a mala cheia de expectativas. Viviane, minha irmã mais velha, já era bem mais experiente que eu. Tinha passado algum tempo nos Estados Unidos, onde papai estudou mais teologia e ela aprendeu inglês. Minha mãe professora na América tomou conta de uma bebê japonesinha mais nova que Vivi. Foi baby sitter. Babá em bom português. Gosto muito de falar dos começos. Diz o rei Salomão que é melhor o fim das coisas que seu começo. Particularmente, sempre achei que a frase estava invertida. Mas o homem que pediu sabedoria acima de tudo que poderia pedir, estava certo. Papai e mamãe estão vivendo hoje, em 2015, a última fase do ciclo da vida familiar. Desculpem a teoria no meio da poesia, mas são eles. Cinco ciclos no total. Morar sozinho. Casamento. Filhos pequenos. Filhos adolescentes. Lançando os filhos e seguindo em frente. O último, a sexta etapa recebe nomes diversos. Alguns chamam de Aposentadoria e Morte. Outros de Ninho Vazio. Não concordo com nenhum dos dois. O ninho nunca fica vazio se os dois pássaros iniciais são receptivos. Se a casa dos pais te boa comida e bom amor. Quanto a aposentadoria, se for fruto de um trabalho honesto e diligente, sobra amor. Em casa, sempre tivemos muitos livros e muito amor. Torcida, orientação e ajuda. Paixão é a palavra mais correta para os filhos dos filhos. O final das coisas pode ser, sim, melhor que o seu começo, caro Salomão. No final, descobrimos quem é quem. Os amigos verdadeiros e os que nunca o foram. Colhemos os méritos de nossas atitudes. Meu pai não apenas colhe, ele é mérito. Pastor Émerito. Mas continua trabalhando. Pastor aposentado é pastor morto. Deve ser por isso que o fofo Rev. Isaias Maciel será sempre incansável. Noventa, cem, cento e dez anos e tomara que Deus esqueça deles por aqui um pouco mais. Desculpe a gafe. Não escrevo sobre o meu pai. Ele é uma figura pública. Fala e escreve por ele mesmo. Eu espero, torço e amo. E já está bom demais.